HISTÓRIAS DA ILHA
Histórias de Maria Rita Ferreira de Jesus
Nascida em Colinas, no Maranhão, em 1947
Casada com Virgílio de Barros Ferreira
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Sempre trabalhando
Eu tive dez filhos.
Tenho vinte e nove netos.
Sete bisnetos.
Vim pra Tocantins bem nova.
Faz quarenta e cinco anos que sou casada com Virgílio.
Fui criada assim:
um pouco na casa d’um, um pouco na casa d’outro.
Até que me formei.
Mas sempre trabalhando.
Trabalhei muito de roça.
De roça eu só não sei brocar e derribar.
Mas o resto… até plantar de enxada, de máquina, tudo eu sei fazer.
Morava nas casas dos outros, então tinha que fazer tudo.
Eu comecei a fazer as coisas,
eu era tão pequena,
que botavam um cepinho no pé do lavatório pra eu poder alcançar.
Pra poder ajudar nas casas dos outros.
Então eu sou uma pessoa criada assim,
todo mundo gostava de mim.
Eu não era respondona aos outros.
Eu não tinha má-criação.
Eu era calma com as pessoas.
Meu coração sempre foi um coração calmo com os outros.
Eu gosto muito de lidar com gente.
Eu tenho paciência com as pessoas.
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Babaçu
Eu vou lá no mato.
Eu pego os coco.
Trago na carrocinha.
Aí eu vou quebrar ele.
Aí eu torro.
Meu marido machuca no pilão.
Eu passo no liquidificador.
Cozinho.
Tiro aquele óleo.
Aí eu boto nos litros.
Aquela borra a gente manda pros porcos.
O óleo eu vendo,
como,
dou pras filhas,
dou pras pessoas próximas.
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Antes de casar
Trabalhava na roça.
Quebrava coco.
Apanhava algodão.
Apanhava fava.
Apanhava feijão.
Eu fiava na roca.
Fiava no fuso.
Foi montado um tear pra mim.
Eu tecia rede.
Tecia coberta.
Quando o arroz madurava, ajudava apanhar.
Quando o algodão madurava, ajudava apanhar.
Quando o feijão madurava, ajudava apanhar.
As favas, pela mesma forma.
Aí nós debulhava.
Botava nas latas.
Eu ia pros coco quebrar coco.
Nós fazia comida às cinco da manhã.
Botava naquelas vasilhinhas,
botava no cofo,
e ia comer aquela comida no mato,
quebrar coco,
meio-dia almoçava.
Chegava de noite ia pisar arroz pro outro dia.
Aí terminava, fazia a janta, jantava.
Aí ia descaroçar algodão.
Depois ia bater aquele algodão,
cortar aquelas tiradinhas tudinho
num balaio bem grandão.
No outro dia à noite
a gente ia fiar.
Quando eu não ia fiar na roca
eu fiava no fuso.
Aí enrolava, enrolava,
fazia aquele novelo
pra mim tecer.
A coberta saía de três cor.
Nós pintava o novelo,
uma parte de vermelho,
uma parte de azul,
uma parte de amarelo.
A gente chamava aquela coberta de
casco de jabuti,
porque ela era de três cor.
Comprava a tinta,
botava naquela panelona de ferro,
botava água dentro,
botava tinta dentro,
ficava aquela água toda pintadinha.
Aí fazia uma de uma cor, outra de outra cor...
Aí que a gente ia pintar aqueles novelos,
um de uma cor, outro de outra cor…
Aí que ia pro tear,
pra ficar aquela rede,
aquela coberta matizada.
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Cozinhando
Eu faço doce.
Eu faço canjica.
Eu faço mingau doce.
Eu faço bolo.
Eu faço vários tipos de comida.
O doce
eu faço de mamão,
faço de banana,
faço de batata.
Eu trabalhei no quartel da polícia
e lá fazia panqueca,
fazia bife à milanesa,
fazia assado de panela,
fazia galinhada,
galinha frita,
fígado de gado.
Em casa eu faço feijão,
a galinha uma hora eu faço frita,
outra hora eu faço de caldo,
outra hora faço ela assada.
A carne,
eu faço o bife dela mal passado,
cozinho antes, depois frito.
O peixe, o Virgílio gosta dele
assado na escama,
assado na palha de banana,
e a gente faz o vinagrete
pra comer com ele.
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A lagoa grande das moças velhas
Era uma lagoa grande que tinha lá.
Chamava “lagoa grande das moças velhas”.
Eu me lembro de
nós do lado de cá lavando roupa,
aquela lagoa no meio,
e os gado do outro lado, bebendo.
Ainda hoje existe lá no Maranhão.
Foram umas duas moças que morreram afogadas nessa lagoa.
E eram moças velhas.
Uma chamava Eva, a outra não lembro o nome.
Eva era branca, com um cabelão,
sobrancelhonas bem espantadonas.
Atracadas com duas surucucus.
Uma matou uma
e a outra matou a outra.
Aí ficou.
Botaram esse nome.